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terça-feira, 30 de novembro de 2010

O papa “justificou” o uso de camisinha?

Em artigo, padre jesuíta explica a base da argumentação de Bento XVI sobre o preservativo
JOSEPH FESSIO*

AMIZADE
Joseph Fessio, autor deste artigo, e Bento XVI são amigos
O papa “justificou” o uso de camisinha em algumas circunstâncias? Não. E também não houve absolutamente nenhuma mudança nos ensinamentos da Igreja. Não apenas porque uma entrevista com o papa não constitui um ensinamento, mas também porque nada do que ele disse difere dos ensinamentos que já existiam.

Então, por que todas as manchetes estão dizendo que ele “aprova” ou “permite” ou “justifica” o uso de camisinha em certos casos?

Essa é uma boa questão. Tão boa que o próprio entrevistador fez praticamente a mesma pergunta durante a entrevista.

O papa fez uma declaração na entrevista, uma declaração que agora tem sido citada pela mídia mundial. Imediatamente, o entrevistador, Peter Seewald [jornalista alemão que já escreveu quatro livros sobre Joseph Ratzinger e conduziu as entrevistas de Luz do Mundo], colocou a questão: “O senhor está dizendo, então, que a Igreja Católica não é, na verdade, contrária, em princípio, ao uso da camisinha?”

O papa esclareceu e expandiu sua declaração anterior.

Vamos olhar para as duas declarações.

Depois de dizer que “não podemos resolver o problema [a aids] distribuindo camisinhas...” e que “a fixação exclusiva na camisinha implica uma banalização da sexualidade...” o papa diz: “Pode haver uma base no caso de alguns indivíduos, como talvez quando um garoto de programa usa uma camisinha, em que pode ser o primeiro passo rumo à moralização, uma primeira aceitação de responsabilidade no caminho à recuperação da compreensão de que nem tudo é permitido e de que ninguém pode fazer tudo o que quer. Mas, realmente, não é a maneira de lidar com o mal da infecção por HIV. Isso pode depende apenas de uma humanização da sexualidade.”

É uma declaração com muitos adjetivos, muito tímida. Ainda assim, suscitou a pergunta de Seewald citada acima. Mas vamos primeiro olhar mais de perto essa declaração. O original alemão para “Pode haver uma base no caso de alguns indivíduos...” é “Es mag begründete Einzelfälle geben...”. A versão em inglês é uma tradução acurada. “Begründete” vem de “Grund”= “solo”, e significa tanto o chão em que pisamos quanto a fundamentação lógica. Há uma ambiguidade porque pode ter o fraco sentido de “alguma base para” ou o forte senso de “fundamentação lógica e ética para”. Essa talvez tenha sido a razão por que Seewald fez uma pergunta adicional, a que voltaremos mais adiante.

É importante notar que houve dois erros muito graves na versão em italiano das declarações do papa, em que muitos dos primeiros artigos se basearam, assim que o embargo foi quebrado pelo jornal do Vaticano, L’Osservatore Romano. (Essa é uma outra história.) O primeiro, o vocábulo alemão “ein Prostituierter”, que só pode se referir aos garotos de programa. A palavra comum em alemão para se referir a uma prostituta é “[eine] Prostituierte”, que é feminina e se refere apenas a mulheres. A tradução italiana “uma prostituta” simplesmente é o contrário do que o Papa diz.

Igualmente problemática, “giustificati”= “justificável”, foi usada na tradução italiana de “begründete”, e arbitrariamente resolve de maneira tendenciosa a ambiguidade.

O papa respondeu: “Ela [a Igreja] não considera a camisinha como uma solução moral ou real, mas, neste ou naquele caso, pode ocorrer no entanto com a intenção de reduzir o risco de infecção, o primeiro passo em um movimento em direção a um novo caminho, um caminho mais humano de viver a sexualidade”.

Em primeiro lugar, uma solução que não é “moral” não pode ser “justificada”. Há uma contradição e isso significaria que algo intrinsecamente mal poderia ser “justificado” para atingir um fim bom. Note: o conceito de “mal menor” é inaplicável aqui. Alguém pode tolerar um “mal menor”; ninguém pode fazer algo que é um mal menor.

Mas a distinção crucial aqui é entre a “intenção” do garoto de programa, evitar infectar o seu cliente, e o ato em si, usar a camisinha. Como a distinção se perdeu em quase todas as reportagens que li, pede-se uma elaboração.

A distinção, em filosofia moral, é entre o objeto de um ato e a intenção de um ato. Se um homem rouba para fornicar, a intenção é copular, mas o objeto é o ato de roubar. Não há uma relação necessária entre roubar e fornicar.

No caso da declaração do papa, a intenção é prevenir a infecção e o objeto é o uso da camisinha.

Aqui está um exemplo dessa distinção que é paralelo ao que o papa afirmou. Ladrões estão usando canos de aço para atacar as pessoas e as lesões são sérias. Alguns ladrões usam canos revestidos por espuma para reduzir as lesões, o suficiente para incapacitar a pessoa e cometer o roubo. O papa diz que a intenção de reduzir os danos (no ato de roubar) pode ser um primeiro passo para uma maior responsabilidade moral. Isso não justifica as seguintes manchetes: “Papa aprova canos revestidos com espuma para roubo”; “Papa diz que o uso de canos revestidos é justificado em algumas ocasiões”; “Papa permite o uso de canos revestidos em alguns casos”.

Claro, alguém pode usar moralmente em algumas circunstâncias, por exemplo, para isolar canos para que a água quente que por eles passa não esfrie tão rápido. E alguém pode usar moralmente a camisinha em alguns casos, por exemplo, fazer balões de água. Mas isso não justifica a manchete “Papa aprova o uso de camisinha”, embora neste caso possa ser verdadeiro. Mas seria intencionalmente enganoso.

Em resumo, o papa não “justificou” o uso de camisinha em qualquer situação. Os ensinamentos da Igreja continuam os mesmos que sempre foram – antes e depois das declarações do Papa.

*Joseph Fessio é editor da Ignatius. editora que lançou Luz do mundo em inglês. O padre jesuíta foi doutorando de Joseph Ratzinger na década de 1970.

Fonte: http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI190412-15215,00.html

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